De Aleijadinho a Maria Auxiliadora: a cultura africana em exposição

Percorrer o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, o Masp, é se transportar para a África e as Américas dos séculos dezenove e vinte. “Imagens do Aleijadinho” e “Maria Auxiliadora: Vida Cotidiana, Pintura e Resistência da Obra” são os títulos das exposições em cartaz na instituição até junho desse ano.

De acervos de museus, igrejas e coleções particulares surgem nas 37 obras atribuídas a Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814) que compõem a mostra. Filho de pai português e mãe escrava, sua condição é um reflexo de um Brasil revertido no mulatismo e na mestiçagem. Os trabalhos da exposição contam com as esculturas feitas pelo artista durante o ciclo do ouro em Minas Gerais, chamadas de “esculturas devocionais”.

Esculturas da exposição “Imagens do Aleijadinho”. Foto: Bruna Guerra

“As esculturas permitem a compreensão de como um artista no contexto colonial da América e refere aos modelos europeus, sobretudo ao barroco e o rococó, mas também absorve a visualidade africana na América e no contexto da história racial presente em Minas Gerais, já que no final do século XVIII, os negros e pardos compunham 80% da população”, explica o curador Rodrigo Moura.

Longe de querer recriar as cenografias religiosas, o curador optou por tornar as obras protagonistas da mostra. Das esculturas presentes no primeiro andar do museu, a maioria já esteve em altares de igrejas, construídas a pedido de ordens terceiras, como as da igreja de São Francisco de Assis em Ouro Preto e os Passos da Paixão de Cristo e os Profetas, em Congonhas. Em busca de fluidez e isonomia, os trabalhos estão em vidros e suspensos todos na mesma altura.

Obra do Aleijadinho. Foto: Reprodução

Em direção a galeria, as cores vivas das 82 pinturas em óleo sobre tela da artista mineira Maria Auxiliadora se destacam. A exposição é dividida em sete núcleos, ‘Candomblé, umbanda e orixás’, ‘Manifestações populares’, ‘Autorretratos’, ‘Casais’, ‘Rural’, ‘Urbano’ e ‘Interiores’.

Humilde e descendente de escravizados, as telas de Maria Auxiliadora (1935-1974) são de uma estética e uma técnica singular. A artista autodidata usava uma mistura de tinta a óleo, massa plástica e mechas do seu cabelo para dar relevo aos quadros.

Tela da Maria Auxiliadora. Foto: Peter de Brito

O título da mostra ‘Vida Cotidiana, Pintura e Resistência’ é uma reflexo da trajetória da artista. “Naquela época, o racismo era muito mais forte do que hoje em dia. Ela era negra, mulher e oriunda de uma família humilde, e suas obras traduzem isso”, ressalta o curador Fernando Oliva. O trabalho de Maria Auxiliadora retrata tanto as condições desfavoráveis dos negros, quanto otimismo com relação a vida.

Estão entre as obras da artista, Velório da noiva (1974), A preparação das meninas (1972) e Banhistas (1973). “A exposição privilegia trabalhos nos quais uma postura combativa e de recusa se manifesta de formas diversas, tanto no plano das próprias telas, com uma figuração inusitada, como na resistência da artista a aprender a pintar, afastando-se do elitismo do bom gosto”, explica o curador.

A artista plástica Maria Auxiliador. Foto: Reprodução

“Imagens do Aleijadinho” e “Maria Auxiliadora: Vida Cotidiana, Pintura e Resistência da Obra” ficam abertas para visitação até 3 e 10 de junho, respectivamente. As exposições integram o ano dedicado às histórias afro‑atlânticas no MASP, com as histórias dos fluxos e dos refluxos entre a África e as Américas através do Atlântico.


Com informações: MASP / InfoArteSP

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.