Um mestre do barro: Zé Pituca e sua arte cheia de detalhes e encantamento
No lugar onde gado bebe água e lambe a terra, criança também brinca. De colher de alumínio na mão, os meninos escavam o barro para se divertir. Zé sabe que carrinho e boneca os pais não podem comprar. Brinquedo é coisa de rico. Daquele chão do barreiro sai brinquedo que loja nenhuma vende e criança da cidade nenhuma tem.
Nas mãos de Zé o barro se ajeita. Se deixa moldar. É que o barro também sabe que naquelas mãos vai deixar de ser lama para ganhar forma e nome. Antes de Zé, a terra já sabia que aquele menino um dia seria um artista famoso.
José Fábio Vicente da Silva é Zé Pituca. Ganhou o apelido por andar sempre nu. “A roupa todo mundo não tinha. Só andava pelado. Aí, Zé-Pi-tu-ca”, ri. É filho do brejo paraibano, de cidade com nome de primo do barro, Areia.
Levar o barro da sua infância como profissão era sentença de quem nasceu em um 12 de outubro de 1962. Zé Pituca hoje é artista plástico. Expõe suas obras no Casarão José Rufino na terra natal, vende no comércio, ministra oficinas e participa de eventos junto com outros artistas.
A mágica da forma
No último sábado (29), na Exposição “Frutos da Paixão”, da Galeria Gamela no Hotel Triunfo, em Areia, Zé Pituca é todo concentração. No espaço, onde 18 artistas plásticos, inclusive ele, apresentaram suas obras de arte, lá está aquele homem menino, a brincar com o barro.
Tem ar sério de quem agora trabalha. As mãos fazem um malabarismo para uniformizar a ideia. A espátula e o palito ajudam a detalhar a imaginação. A água amansa a pressa da matéria que quer logo se tornar objeto decorativo. Quando terminada vai ganhar um nome como todas as outras. “Aí é criatividade”, conta o segredo do batismo de suas peças.
Zé Pituca é um mestre, cria arte com barro, e trabalha também com cimento armado. “Sou muito observador. Então, qualquer coisa que se meta na minha frente eu dou vida”, afirma. Em obras cheias de informação, cada elemento tem um sentido. A inspiração, nem mesmo ele sabe aonde nasce. “É uma coisa que assoma na mente. Vem repentinamente”, diz.
A vida no interior, a religiosidade, a natureza e a sexualidade são temáticas que ganham forma em suas mãos. Um entrelaçamento de arte e ideia original. “Vou dando criatividade porque eu não gosto de fazer peça repetindo a mesma peça que um faz. As peças que eu faço são todas únicas, nunca faço uma do mesmo jeito”, esclarece.
Crise é palavra que não existe no vocabulário do artista de Areia. “A gente sobrevive. O pessoal gosta, valoriza muito. São trabalhos diferentes que muitas pessoas não veem. Aí, quando olha, compra, duas, três peças e aí vai levando”, observa. Suas obras custam de R$ 800 a R$ 2 mil, mas se pudesse não as venderia. Faria coleção.
Universo de expressões
Para Zé Pituca falar do barro é relembrar da infância pobre e se reencontrar com o artista estiloso de hoje. Os olhos do Zé até marejam. “O barro para mim é tudo, tudo. Faço por amor. Gosto de arte. Arte para mim é tudo. Arte é bom porque tira o estresse, não tem depressão, não tem preocupação. A mente é totalmente sadia. Uma mente sadia não tem preocupação, não tem nada”, garante.
Obras de Zé Pituca em exposição
Por Marcella Machado, da redação do Conexão Boas Notícias
É valorizando o que é nosso, que somos valorizados. Parabéns!
Excelente matéria!
Parabéns pela sensibilidade, Marcella!
E também pela qualidade do texto!