Projeto faz inclusão de surdos em equipes de taekwondo, em Campina Grande
Um projeto de inclusão social denominado Projeto Surdo Olímpico leva a prática esportiva do taekwondo para pessoas com deficiência auditiva, em Campina Grande. O projeto é totalmente gratuito e dirigido pelo professor Ricardo Henrique. Os treinos começaram em setembro e contam com 14 jovens inscritos.
Para conseguir trabalhar com esse público de forma precisa, além do professor que treina a equipe, também estão envolvidos quatro intérpretes de Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Durante o período de isolamento social, o espaço foi fechado e as atividades ficaram paradas. Com a flexibilização das atividades coletivas, o local voltou a treinar jovens, e agora iniciará mais esse projeto atendendo ao novo perfil de público.
Iniciativa
O grupo Team Ricardo Taekwondo já trabalha há sete anos com o parataekwondo, treinando atletas deficientes físicos e preparando-os para uma possível classificação em campeonatos regionais, nacionais e olímpicos.
A partir dessa iniciativa, o professor Ricardo enxergou a necessidade de ampliar esse acesso ao esporte e inovar. “Sempre trabalhamos o esporte adaptado para o parataekwondo e agora surgiu a oportunidade de aumentar a grade de alunos com esse novo formato. A pandemia chegou e com ela veio a ideia de inovar, renovar e enxergar que podemos ir além”, disse.
O professor pretende contar com uma equipe ainda maior. “A procura pela nossa equipe já está muito grande. Uma equipe só não será suficiente e quero aprender mais, ajustar, adaptar. Temos potencial de ser uma das maiores equipes do Brasil e trabalharemos muito para isso”, comentou.
O professor Danilo Queiroz é um dos envolvidos no projeto e será um dos intérpretes. Ele se considera feliz pela oportunidade de fazer parte da iniciativa de inclusão. “Fico muito feliz em poder orientar às pessoas sobre esta ideia de incluir pra mudar. É algo que começa muito simples, mas em breve terá um grande alcance e poder de mudança no comportamento da sociedade como um todo”, falou.
O que acham os alunos
A maquiadora Fernanda Ribeiro, de 22 anos, mora na cidade de Ingá e vai fazer parte da turma de Campina Grande. Ela é surda e teve a oportunidade de fazer um treino experimental com atletas ouvintes. Fernanda relatou que a experiência foi muito boa e de muito aprendizado.
“Na primeira vez que fui treinar taekwondo, gostei muito. É uma experiência muito boa, me senti diferente e vi como é importante para a saúde. O ouvinte aprende como é o surdo, e o surdo através da percepção visual aprende com os ouvintes, com os movimentos, melhorando a aprendizagem”, relatou.
O atleta Vandinaldo Leite, conhecido como Vando, de 28 anos, é professor de educação física e é surdo. Ele perdeu a audição aos 10 anos de idade e, como aprendeu também a falar, consegue fazer leitura labial. O professor vai fazer parte da equipe como um dos intérpretes que ajudará na comunicação dos ouvintes com os surdos. A iniciativa do projeto, para ele, mostra o quanto o surdo pode ser inserido na prática esportiva.
“Esse é um projeto que mostra que o surdo pode ser inserido no esporte e faz a inclusão acontecer, pois muitas vezes os alunos ouvintes são convidados para treinar junto com os surdos, fazendo assim crescer uma grande equipe”, comentou.
Vando ainda relatou que além da inclusão, esse tipo de atividade em grupo promove ensinamento.
“Nós surdos utilizamos a língua de sinais para nos comunicarmos. Quando nos inserimos em um ambiente de ouvintes, ensinamos sinais de libras para nossos colegas ouvintes, trocamos mensagens por redes sociais utilizamos as mídias sociais para explicar o projeto e chamar a atenção dos surdos para que eles também possam participar do projeto, se inserindo na sociedade e no meio esportivo, aprendendo e compartilhando ensinamentos”, relatou.
Lição de vida
Iniciativas como essa do Projeto Surdo Olímpico têm, além do projeto de inclusão, as lições de vida que os envolvidos aprendem diariamente. Para o professor Ricardo, a maior lição é deixar de lado as negações da vida.
“A maior lição é tirar o ‘não’ do nosso vocabulário. Sempre temos o não como garantia e precisamos arriscar o contrário. Precisamos saber que sempre teremos que superar e ir além do que os outros pensam, ir além das nossas dificuldades que não são poucas. Todos os dias é uma vitória e um progresso que vivemos e podemos levar a esses futuros atletas olímpicos”, comentou.
Já o professor Danilo considera que essas experiências dão sentido a vida.
“É algo que dá sentido à vida. Colocar a própria vida à disposição do próximo nos faz pensar que ninguém está sozinho e todos precisamos um do outro em maior ou menor grau”, disse.
A importância da inclusão
Muitos deficientes acabam não tendo a oportunidade de ter acesso à integração social, inclusive nos esportes, por faltar estrutura para recebê-los e, também, por não se sentirem capazes de treinar junto a uma equipe. O Projeto Surdo Olímpico trabalha essa inclusão e mostra que é possível e, também, necessário.
De acordo com a psicóloga Monique Hélen, é fundamental a integração dos deficientes em outros meios sociais para a saúde mental e física dessas pessoas.
“Ocorre uma diferença natural e ela não deve ser vista como negativa. O povo acredita que levar as pessoas para a escola já é suficiente, mas tem que haver uma forma de integrar essas pessoas na sociedade geral, e a atividade física é uma forma de integração e de estar convivendo em sociedade, fazendo a manutenção da saúde mental e física das pessoas. É fundamental enxergar a necessidade de que essas pessoas tenham acesso a isso”, afirmou.
Além disso, para Monique é necessário entender que, para atender uma pessoa com deficiência, deve haver adaptação e que não isso é impossível de acontecer.
“A gente tem que entender que para uma pessoa com deficiência, as atividades precisam ser adaptadas a sua realidade de alguma forma. É necessário entender que é possível que o deficiente seja inserido em atividades normalmente, como qualquer outra pessoa, mas que para isso acontecer, é necessário haver adaptações. Isso não quer dizer que é algo ruim ou impossível. Muito pelo contrário, é possível e é construtivo para todo mundo”, comentou.
O papel dos pais
Segundo a psicóloga, a rede de apoio familiar é fundamental para a inclusão, deixando de lado o receio da dificuldade que os pais imaginam que os filhos vão enfrentar, deixando-os viverem suas experiências dentro das situações de inclusão.
“Ser pai diante da situação de ter um filho deficiente é desafiador. Ao mesmo tempo que os pais querem incluir os filhos na sociedade, eles entendem que há uma diferença e que é necessário adaptação, o que pode gerar algum receio. Proteger demais pode deixá-los em uma situação e sentimento ainda maior de incapacidade e é isso que deve ser quebrado”, disse.
Por isso, Monique considera fundamental deixar de lado o impulso protetor e apoiar no processo de inclusão.
“Muitos pais querem proteger e isso é bom. A rede de apoio familiar é importante, só que é muito importante também deixar que essas pessoas dêem os próprios passos. É essencial deixar de lado o impulso protetor e apoiar os filhos a darem os próprios passos, mostrando-os o quanto eles são capazes”, concluiu.
Treinos em meio à pandemia
Para que os treinos aconteçam, uma série de medidas preventivas contra o coronavírus foi adotada pela equipe idealizadora do projeto, com uma padronização interna de rotina de acesso.
No Centro de Treinamento (CT), localizado no bairro da Liberdade, todo o material que possa acumular pessoas foi tirado, como mesas e cadeiras. Só deverá ter acesso ao local quem for treinar e, em seguida, ninguém poderá permanecer no CT.
O ambiente será higienizado uma hora antes de cada aula. Cada dupla de treino será a mesma do início ao fim do treino. Além disso, não será permitido o empréstimo de proteções e materiais de treinos, tendo cada atleta que levar seus próprios equipamentos.
Já o ambiente terá à disposição álcool em gel, álcool líquido 70% para higienização do ambiente e dos materiais, tapete sanitizante para entrar no tatame, além de cordas limitando a entrada das pessoas. O ambiente tem capacidade para 39 pessoas, mas vai trabalhar apenas com o limite máximo de ocupação de 15 pessoas, já incluindo o professor.
Com informações: G1 Paraíba
Edição: Josy Gomes Murta