História em quadrinhos plurilíngue retrata língua indígena de sinais
A obra é o TCC de licenciatura em Letras Libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
A história em quadrinhos produzida por Ivan de Souza retrata, de forma pioneira, a língua indígena de sinais utilizada pelos surdos da etnia terena. A obra tem o propósito de fortalecer o reconhecimento e a preservação das línguas de sinais indígenas e é apresentada em formato plurilíngue, sinalizada também na Língua Brasileira de Sinais (Libras).
A comunicação por meio da língua materna é importante pois ajuda a manter viva a cultura, a identidade e a história dos povos indígenas. Nas aldeias da etnia terena, localizadas principalmente no estado de Mato Grosso do Sul, a língua oral terena é amplamente utilizada. Os surdos dessa etnia também se comunicam com sinais diferentes dos pertencentes ao sistema linguístico utilizado pelos surdos no Brasil (Libras). Após diversas pesquisas, especialistas concluíram que esses sinais constituem um sistema autônomo, chamado língua terena de sinais.
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“A história mostra um pouco da rica cultura desse povo, as situações, consequências e resistência após o contato com o povo branco.”
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Sol: a pajé surda ou Séno Mókere Káxe Koixómuneti, em língua terena, conta a história de uma mulher indígena surda anciã chamada Káxe que exerce a função religiosa de pajé (Koixómuneti) em sua comunidade. Ao ser procurada para auxiliar em um parto e após pedir a benção dos ancestrais para o recém-nascido, o futuro do povo terena é revelado e transmitido a ela em sinais. “A história mostra um pouco da rica cultura desse povo, as situações, consequências e resistência após o contato com o povo branco”, revela Souza.
O trabalho de conclusão do curso de licenciatura em Letras Libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR) teve início em 2017, quando o estudante pesquisava a história dos surdos no Paraná, na iniciação científica. Todo o processo teve acompanhamento de pesquisadoras que já desenvolviam atividades com os terena surdos, usuários da língua terena de sinais. A comunidade indígena também teve participação ativa no desenvolvimento e depois, na validação da obra junto ao seu povo.
Material didático
Para Maíza Antonio, continuar pesquisando o tema é importante para que os próprios integrantes das aldeias entendam melhor os sinais utilizados por parte de seu povo. Indígena da etnia terena, ela é professora de educação infantil e trabalha com a língua materna na escola da comunidade. “Nossos alunos têm optado por estudar na cidade, por não estarmos preparados para recebê-los em nossa escola. Essa história em quadrinhos servirá como material didático para trabalharmos com os alunos surdos e como incentivo para que nós, professores, busquemos novas ferramentas de ensino nessa área”, comenta.
Sinalário
Souza e os especialistas que o auxiliaram no projeto também desenvolveram um sinalário, isto é, um registro em Libras dos principais conceitos apresentados na narrativa visual e um glossário plurilíngue abrangendo palavras utilizadas no dia a dia da comunidade. “Levantamos os vocabulários que mais se repetiam e organizamos em uma planilha. Depois buscamos localizar os sinais já existentes em sites e aplicativos. Filmamos os sinais e disponibilizaremos esse material no YouTube, com o objetivo de expandir o conhecimento sobre as línguas sinalizadas e de minimizar a barreira linguística”, explica.
De acordo com o autor, o trabalho tem relevância para os indígenas da comunidade terena e de outras etnias e para a sociedade em geral. “Esse é mais um material disponível para os terena ensinarem sua história de forma acessível a ouvintes e surdos. É importante também para mostrar à sociedade como existem povos, culturas, identidades e línguas diferentes no país. E que essa diversidade precisa ser respeitada, preservada e valorizada”.
Esperança
O jovem escritor tem esperança de que o trabalho possa despertar a sensibilidade para com os povos indígenas e para as demais línguas de sinais presentes no Brasil. Outro objetivo do autor é que, com o reconhecimento dessas línguas autônomas de sinais, torne-se possível que surdos indígenas tenham, de fato, o direito de serem ensinados em sua língua materna garantido, assim como apregoado na Constituição Federal. Ele pretende distribuir a HQ em escolas indígenas, com o objetivo de auxiliar o fortalecimento linguístico e de ressaltar a importância das línguas de sinais para essas comunidades.
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“Cada língua reflete um modo de ver o mundo, um modo diferente de pensar.”
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Além de possibilitar a disseminação e a preservação da língua terena de sinais, a história tem o propósito de evidenciar a cultura e a história desse povo. O estudante cita uma das pesquisadoras que trabalhou com ele nesse projeto para definir o que pensa sobre o tema. “Cada língua reflete um modo de ver o mundo, um modo diferente de pensar. Se perdemos uma língua, perdemos possibilidades, perdemos a capacidade de criar, imaginar, pensar de um modo novo e talvez até mais adequado para uma dada situação”, indica Priscilla Alyne Sumaio Soares em sua tese de doutorado intitulada Língua Terena de Sinais. “Só podemos preservar aquilo que é registrado e esse é um dos nossos objetivos, preservar uma pequena parte da história do povo terena por meio da HQ”, afirma Souza.
Com informações: Ciclo Vivo
Edição: Josy Gomes Murta
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