Ator funda produtora audiovisual para empregar profissionais negros
Iracema Rosa Filmes e Todos Negros do Mundo (TNM.prod), tem como objetivo aumentar a diversidade no setor
Anderson Jesus, 44 anos, é fundador das empresas Iracema Rosa Filmes e Todos Negros do Mundo (TNM.prod), a segunda focada em abrir espaço para profissionais negros dentro do setor.
O empreendedor começou a se interessar por arte desde criança, especialmente pela atuação. Porém ele sabia que teria dificuldades na profissão. “Por ser um homem preto, favelado e pobre, eu entendi que seria complicado. Já é difícil para atores brancos conseguirem trabalhos com frequência na área. Sabia que seria ainda mais para mim”, conta. A partir daí Anderson decidiu criar suas próprias produtoras.
O despertar
Jesus começou a ter contato com audiovisual na infância. Sua mãe trabalhava como empregada doméstica e não tinha com quem deixar o filho. “Minha mãe não tinha com quem me deixar durante o dia enquanto trabalhava, então eu passava o dia inteiro vendo televisão. Despertou um interesse”, diz. Aos 12 anos de idade, fez uma peça de teatro na escola, e ouviu elogios da professora, comentando que ele poderia ser ator.
“Fiquei com aquilo na cabeça. Quando fiz 18 anos, me mudei para Uberaba, em Minas Gerais, para fazer um curso gratuito de teatro”, conta Jesus. Voltou para São Paulo depois de um ano e se afastou da carreira em artes cênicas para trabalhar em outros setores, como o de telemarketing. Infeliz por estar longe do que amava, decidiu tentar novamente e voltar para a atuação em 2007. Começou também um curso profissional de escrita de roteiro. “Pensava que eu poderia me oferecer o trabalho se ninguém me oferecesse.”
Iracema Rosa Filmes
Depois de terminar o curso, uma amiga o indicou para um colega que estava em busca de um roteirista para um comercial. “Fiz dois textos para ter mais chances de ser aprovado, e deu certo. Então, fui convidado para dirigir o comercial também. Apesar de não ter experiência como diretor, ele me falou que eu teria facilidade por ser ator e por ter criado a história”, afirma. Foi neste momento que veio o insight. “Pela primeira vez, vi algo que havia saído da minha cabeça tomar forma. Então, decidi estudar também produção audiovisual já com o objetivo de ter a minha própria produtora”, afirma. Em 2011, fundou a Iracema Rosa Filmes.
Em busca de clientes, Jesus passava pelo centro de São Paulo oferecendo o trabalho da produtora. No entanto, como não tinha um portfólio significativo para mostrar, tinha dificuldade de despertar o interesse dos comércios. Passando na frente de um estúdio de tatuagem, viu uma televisão que mostrava fotos. “Perguntei se o tatuador precisava de um vídeo, e ele comentou que achava muito caro. Eu precisava de um portfólio para mostrar para as empresas e ofereci o vídeo em troca de uma tatuagem”, diz Jesus. O acordo deu certo. Ele conseguiu chamar a atenção de mais clientes e foi crescendo no setor.
Ideais de projetos
Uma paixão de Jesus sempre foram os programas investigativos. Então, por meio das redes sociais, entrou em contato com uma profissional que trabalhava em um canal de televisão que produzia este tipo de conteúdo, e enviou algumas ideias de projetos. Ela demonstrou interesse e marcou uma reunião. Jesus precisava levar um projeto prévio e pediu um empréstimo de R$ 12 mil para comprar câmeras melhores e fazer a gravação.
“Ela gostou e disse que mandaria para a equipe dos Estados Unidos avaliar”, diz Jesus. A aprovação veio um ano depois, com o lançamento da série “Desaparecidos”, que contava histórias de pessoas desaparecidas no Brasil e teve duas temporadas. A estreia foi em 2015. O trabalho abriu portas para a produtora, que começou a fazer projetos com outras emissoras.
Todos Negros do Mundo (TNM)
Ainda assim, Jesus sentia na pele como o racismo ainda era presente no setor. “Quando falamos de pautas de raça e gênero, somos taxados de maneiras negativas. Eu sabia dessa dificuldade e não queria que a Iracema Rosa Filmes fosse colocada somente nesse lugar”, afirma. Com vontade de fazer um trabalho relacionado a racismo, ele fundou a Todos Negros do Mundo (TNM), primeiramente como um portal de notícias para divulgar novidades relacionadas a pessoas negras.
O projeto surgiu em 2016 como um trabalho de conclusão de curso (TCC) de pós-graduação de Jesus. Em 2018, ele decidiu mudar a plataforma para se tornar a produtora TNM.prod. O primeiro lançamento foi espetáculo “Tia Má com a Língua Solta”, com a influencer Maíra Azevedo, atualmente disponível nas plataformas de streaming Now, Vivo Play e Looke.
Os trabalhos nas duas produtoras são distintos, explica Jesus, já que a Iracema Rosa Filho se envolve em projetos de diversos temas. Em 2021, a empresa faturou R$ 800 mil, e a expectativa é chegar a R$ 1 milhão neste ano. Já a TNM.prod foca 100% produções com protagonismo negro — dentro e fora das telas.
Tem de ser diversidade de verdade
“Muitas empresas querem fazer conteúdos inclusivos, mas na hora da gravação só os atores são negros. O resto da equipe, que fica nos bastidores, é branco. Ou seja, o dinheiro continua indo para o bolso de sempre”, diz Jesus, complementando que a empresa ainda não tem um faturamento expressivo. E é isso que ele quer mudar: “Eles querem contratar pessoas negras apenas perto do mês da Consciência Negra, e queremos mostrar que podemos oferecer oportunidades durante o ano inteiro. Tem de ser diversidade de verdade.”
Com informações: Revista PEGN
Edição: Josy Gomes Murta