Física brasileira integra equipe do maior laboratório de física de partículas do mundo

Carla Göbel é coordenadora adjunta de Física do LHCb, experimento do maior laboratório de física de partículas do mundo que engloba mais de 1,5 mil pesquisadores.

Foi nas aulas de química do ensino médio que Carla Göbel Burlamaqui de Mello se encantou com a ideia de que toda a matéria do Universo era formada por pequenas partículas elementares. E é exatamente a curiosidade por compreender as menores constituintes da matéria que impulsiona os estudos de Göbel há mais de 30 anos.

Hoje, ela é professora associada da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e, neste mês, deu um grande passo em sua carreira. Desde o dia 1º de agosto, assumiu o cargo de coordenadora adjunta de Física de um dos experimentos da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (Cern), o maior laboratório de física de partículas do mundo, localizado na Suíça.

Trata-se do experimento LHCb (sigla em inglês para Large Hadron Collider beauty experiment), especializado em investigar as partículas que contêm quarks charm e beauty, também chamados de quark c e b, respectivamente. Sendo quarks, eles representam os menores constituintes da matéria e são os “irmãos” mais pesados dos quarks up e down que formam os prótons e nêutrons que conhecemos.

Peça-chave para os cientistas

Teorizados e descobertos ao longo da década de 1970, esses quarks pesados são uma peça-chave para os cientistas entenderem o que aconteceu logo depois do Big Bang e como o Universo evoluiu desde então.

“Um dos nossos objetivos é entender porque, lá nos primeiros instantes após o Big Bang, houve uma preponderância de matéria sobre antimatéria, dando origem a todas as grandes estruturas que vemos hoje no Universo”, afirma Göbel.

Utilizando o Grande Colisor de Hádrons (LHC), os cientistas conseguem produzir uma grande quantidade de energia para colidir prótons. Esse processo provoca a produção de várias novas particulas, bem como suas correspondentes em antimatéria. Por conta da conversão de energia em matéria, muitas delas são mais pesadas que os prótons originais e, por isso, interessa aos cientistas observar seus decaimentos em outras partículas mais leves.

Trabalho de Göbel

Os pesquisadores, então, coletam dados sobre o que foi gerado no experimento e comparam o decaimento de partículas e antipartículas (no caso do LHCb, daquelas que contêm os quarks b ou c e seus respectivos antiquarks), avaliando características e quantidades. Assim, espera-se reproduzir e entender o que, como e por que houve o mencionado desequilíbrio entre matéria e antimatéria que criou tudo o que existe no Universo.

Para ajudar a chegar a essa resposta, mais de 1,5 mil cientistas, engenheiros e técnicos de diversos países participam do experimento LHCb e produzem uma média de 50 artigos por ano sobre os testes realizados.

O trabalho de Göbel será avaliar, juntamente com a coordenadora do experimento, a qualidade e validade dos dados gerados por esses estudos antes que eles sejam submetidos aos periódicos científicos. “Somos responsáveis por estabelecer comitês e acompanhar o escrutínio de trabalhos desenvolvidos no grupo, para que sigam para publicação”, explica.

Novos desafios de carreira

O convite para atuar como coordenadora adjunta de Física do experimento, cargo que assumirá até julho de 2024, foi feito pela coordenadora de Física eleita, a francesa Yasmine Amhis, pesquisadora do Laboratório Irène Joliot-Curie (IJCLab), da Universidade Paris-Saclay. Ambas são as primeiras mulheres a ocuparem os postos de liderança do experimento LHCb.

“Eu nunca pensei muito sobre isso [a representatividade de gênero na ciência], mas essa discussão tem crescido cada vez mais. Então nós vamos percebendo, e existem estatísticas que mostram isso, que mulheres são minoria nas ciências duras e, mesmo para aquelas que estão no campo, pode ser muito difícil avançar na carreira”, observa Göbel.

Para a professora da PUC-Rio, é importante que garotas que se interessem por ciência sejam estimuladas a seguir na área. “Quando uma estudante que gosta de ciência conhece trajetórias de mulheres cientistas que já atuam naquilo que a interessa, ela passa a ver aquela carreira como uma possibilidade, e isso é muito positivo”, afirma.

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“Podemos trabalhar no mesmo nível que os nossos companheiros norte-americanos, europeus, chineses, russos etc.”

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Göbel considera que esse reconhecimento mostra que pesquisadores que não vivem no eixo EUA-Europa também têm bom desempenho. “Temos incorporada em nós a ideia de que a geração de conhecimento está no Primeiro Mundo. Mas, na realidade, podemos trabalhar no mesmo nível que os nossos companheiros norte-americanos, europeus, chineses, russos etc.”

Atuando na área de física de altas energias desde a década de 1990, a professora iniciou sua carreira no Rio de Janeiro, formando-se em Química pela PUC-Rio em 1991. Três anos depois, obteve mestrado em física de partículas na mesma instituição.

Logo em seguida, começou seu doutorado-sanduíche no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e arrumou as malas para participar de estudos no Fermi National Accelerator Laboratory (Fermilab), nos Estados Unidos. Defendeu sua tese em 1999, época em que já atuava como professora adjunta na Faculdade de Engenharia da Universidad de la República, no Uruguai, onde trabalhou até 2002.

No ano seguinte, em 2003, retornou à PUC-Rio, dessa vez não como estudante, mas como professora assistente do Departamento de Física da universidade. Hoje, é professora associada da instituição e se dedica ao novo cargo conquistado no Cern.


Com informações: Revista Galileu

Edição: Josy Gomes Murta

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