A longa jornada noite adentro do pássaro ferido
Por Ivan Antonio
Em pleno voo o pássaro lá de cima observa a correnteza do rio e as águas que descansam no colo das pedras. Uma água bem mansinha como a se ninar repousa enquanto outras como feras seguem se debatendo contra os rochedos, troncos e galhos de árvores. As águas jovens e tão rebeldes seguem furiosamente o curso a abrir fendas na imensidão. Tudo acontece sob o olhar atento do velho pássaro que já foi manso e já foi fúria. Agora é noite e tudo é quase silêncio; O ruído das pedras a gemerem enquanto as fortes correntezas incessantemente tocam com violência os seus corpos parece música mas não é! É dor…
Sentei-me e comecei a escrever a história desse pássaro e quando dei por mim estava escrevendo histórias sobre pássaros, pedras e correntezas, lembrei que já fui e talvez ainda seja tudo isso, um dia pássaro, no outro pedra e em seguida …Correnteza.
As vezes me pego em pleno voo a observar o mundo e sinto que o mundo também me observa e nessa jornada encontro em mim as minhas rachaduras, velhas cicatrizes na minha alma. Se a dor é infinita como são as dores das pedras a receber as braçadas das águas-feras, então eu choro bem baixinho como fazem as velhas árvores.
Os velhos choram silenciosamente, quase um soluço imperceptível eles são referências para os jovens e quando são chamados de mestres e mestras quase se esquecem que tem lágrimas. Era uma noite fria e chuvosa, tudo ao meu redor era solidão, enquanto escrevia sentado debaixo do viaduto
um homem embriagado me provocava noite a dentro a vociferar: – Se era doutor por que morava na rua?
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Saber escrever era pra ele um passaporte para as portas da comida, uma casinha limpa e um café quente todas as manhãs.
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Talvez realmente fosse tendo em vista se ele soubesse que ali a minha condição era de pássaro a observar lá de cima o drama do passarinho-homem que não sabe que pode voar. Finalmente ele adormece e a fogueira acesa se torna minha parceira, quando o vento bate um clarão ilumina o papel e então posso revisar o que escrevo. Vejo mulheres e homens abatidos em todos os cantos daquele lugar fétido em que durmo na companhia dos miseráveis.
A inspiração me abandona e tento em vão continuar a escrever, uma menina de apenas 12 anos chora bem baixinho para não acordar o pai bêbado. Chorava de medo e fome e de fome e de medo eu entendo, lhe ofereço um pedaço de pão com queijo e mortadela, ela recua por um tempo mas a dor da fome é impiedosa, digo que não trisquei, o pão está limpinho e eu já me alimentei, ela pega e acorda o irmãozinho mais novo e eu sou testemunha do milagre dos peixes e da divisão dos pães,
pra mim Jesus estava ali naquelas crianças famintas, Jesus dividido por dois….
Amanhece e as crianças são acordadas aos berros por aquele homem de ressaca, é chegada a hora de ir para os semáforos pedir esmolas, ganhar dinheiro, comprar cachaça e de novo se
embriagar. E as crianças? A mãe fora assassinada pelo pai e elas são apenas crianças, seus gritos não são ouvidos na multidão.
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Foram vinte e cinco anos e nestas duas décadas e meia perdi a conta dos meus voos e de quantas vezes me tornei pássaro, pedra e correnteza.
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Atualmente viajo pelo mundo contando as histórias que vi, vivi, morri e renasci, me tornei um pássaro contador de histórias a fazer apelos a pedir ajuda para curar feridas, as minhas e a de
tantos, crianças, homens e mulheres em situação de rua. Choro escondido não por ser mestre mas por me sentir uma velha árvore, as vezes abrigo, as vezes cortada ao meio. Tudo em mim é esperança e renascimento…
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Um existência breve talvez, mas com o desejo de quando ao ser chamado o divino abra um sorriso e diga: Eu te reconheço…
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Sejam bem-vindos aos projetos do Teatro da Solidão Solidária:
Meu irmão voltou pra casa
e ao Festival Mundial de Cultura da Paz 2023
Ivan Antonio
Dramaturgo, cineasta, poeta, cantor e compositor. Criador do Teatro da Solidão Solidária (TSS). Natural de Arcoverde (PE). Graduado em Cinema e Vídeo pela FTC (Faculdade de cinema e vídeo) Salvador – Bahia. Pós-graduado em Literatura Brasileira, com extensão em Literatura Universal, e em Neuropsicopedagogia, pela Faculdade Metropolitana de Ribeirão Preto – São Paulo. Mestrando em Negócios Internacionais pela Must University (Flórida – EUA).
Representou o Brasil no Estados Unidos no Brazil Week (Nova York – EUA). Igualmente foi o representante brasileiro em diversos outros eventos internacionais, como o Festival Mundial de cultura da paz (Lyon – França), Festival Aos olhos do mundo (Roma – Itália), Festival Internacional de arte e cultura (Guimarães – Portugal), Festival internacional de teatro – Fazer a festa (Porto – Portugal) e BrazilNoar (Nova arte brasileira, Barcelona – Espanha).
Livros publicados, todos, no gênero Poesia: “Eu, Sonhador”, “Flores em Pé de Guerra”, “O Último Barco do Cais”, “Balada para um Triste Amor”, “Bicho Solto”, “Mar Adentro” e “Amor Revolução Silenciosa”.
Como ator já encenou peças e filmes: “Um Sanatório para Freud”, “Mil Operários em Construção”, “A Caminho da Ternura” e “Carandiru”. Esteve no elenco de filme, como Carandiru, de Hector Babenco. Como ator, atuou em novelas brasileiras, como Sangue do meu sangue (SBT). Como diretor dirigiu grandes nomes do teatro, televisão e cinema brasileiro: Paulo Betti e Sérgio Mamberti (A caminho da ternura), Tadeu Di Pietro (Mil operários em construção), Luciana Paes (Um sanatório para Freud).
Ministrou palestras, oficinas, lançou livros e participou de shows em diversos países do mundo: Estados Unidos, França, Itália, Inglaterra, Alemanha e Portugal.
Foi Secretário de Cultura, Turismo e Relações Internacionais, do município de Camaçari, na Bahia.
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