Escrevivências: 10 livros que ecoaram vozes negras
Os versos do Poeta do Absurdo, Zé Limeira, proclamam: “Se Palmares não vive mais, faremos Palmares de novo”. Com estas palavras o nobre poeta faz ecoar a voz da resistência da população negra desde o processo de escravatura que vem se “aquilombando”.
Na literatura as “escrevivências” negras ocupam cada vez mais espaço no mercado editorial. Editoras como Ogum’s, Malê, Padê, Barabô, Caramurê, dentre outras, promovem importante disputa de narrativas que contam histórias de amor, dengo, afeto e luta.
Partindo desse pressuposto, o Portal Correio Nagô, que faz parte do Instituto Mídia Étnica, publicou uma retrospectiva 2017, destacando 10 obras de autores e autoras negras que fizeram ecoar vozes pretas em 2017.
O Conexão Boas Notícias garimpou a informação e trouxe aqui para você. Confira:
1. Dia Bonito Pra Chover
Em “Dia Bonito pra Chover”, a baiana Lívia Natália transborda poemas de amor afrocentrado pelo olhar de uma mulher negra. É um livro de pura militância. “a literatura feita por mulheres negras na diáspora funciona como uma estratégia de resistência, de sobrevivência que inclui um potencial de revolução formidável”. (Cristiana Sales)
Pela publicação, Lívia venceu o Prêmio APCA 2017, da Associação Paulista de Críticos de Artes, como melhor livro de Poesia.
2. Calu
No livro Calu, as autoras Cássia Vale e Luciana Palmeira ressaltam a importância de trabalhar o sentimento de pertencimento da população para o patrimônio material e imaterial, por meio das vivências da garota Calu. As autoras também venceram o Prêmio APCA 2017, na categoria Infantil/Juvenil.
3. Mulheres, Cultura e Política
Publicado nos anos 80 nos Estados Unidos, ‘Mulheres, Cultura e Política’ ganhou sua primeira versão em português pela Boitempo Editorial. O livro de Angela Davis é uma compilação de discursos e artigos que sintetizam e complementam o pensamento da ativista sobre economia, cultura, política e militância.
4.Olhos de azeviche
A coletânea traz textos de dez escritoras que estão renovando a literatura brasileira. A obra reúne vinte contos e crônicas das escritoras Ana Paula Lisboa, Cidinha da Silva, Conceição Evaristo, Cristiane Sobral, Esmeralda Ribeiro, Fátima Trinchão, Geni Guimarães, Lia Vieira, Miriam Alves e Taís Espírito Santo
5. Na sua pele
Quantas vezes passaram em sua timeline fotos de pessoas com o livro de Lázaro Ramos? Pergunto sobre aquelas fotos com ângulos fechados em que leitor e autor ficam com o rosto lado a lado?
A repercussão nas redes sociais revela o sucesso da publicação do escritor, diretor e ator baiano. “Na sua pele”, Lázaro narra suas histórias (que se tangenciam com as de milhares outros pretos e pretas) Temas como ações afirmativas, gênero, família, empoderamento, afetividade e discriminação costuram a narrativa.
6. No seu pescoço
A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie traz “No seu pescoço” doze contos sobre imigração, desigualdade racial, dos conflitos religiosos e relações familiares. Chimamanda combina técnicas da narrativa convencional com experimentalismo.
No conto que dá nome ao livro – escrito em segunda pessoa -, a autora parte da perspectiva do indivíduo para atingir o universal que há em cada um de nós e, com isso, proporciona a seus leitores a experiência da empatia, bem escassa em nossos tempos.
7. O que é lugar de fala
“O que é lugar de fala”, da filósofa Djamila Ribeiro é um daqueles livros necessários para mulheres e homens, para negros e brancos. Partindo de obras de feministas negras como Patricia Hill Collins, Grada Kilomba, Lélia Gonzalez, Luiza Bairros, Sueli Carneiro, o livro aborda, pela perspectiva do feminismo negro, a urgência pela quebra dos silêncios instituídos explicando didaticamente o que é conceito ao mesmo tempo em que traz ao conhecimento do público produções intelectuais de mulheres negras ao longo da história.
8. Terra Negra
“Cristiane Sobral nos desnuda com uma poesia cheia de personalidade, cores, aromas, enredos, densos enredos e escreve como tribo. Conhecedora. Caminha sem solidão porque traz as hordas dos povos em diáspora inebriados e entrelaçados em sua narrativa ética, estética e caudalosa. Curiosa sua arte, lindo o seu tear, minha querida Cristiane! A voz de uma mulher negra é a voz que se nega ao silenciamento, a voz que se impõe à porta da Casa Grande e entra. Arrebenta a tranca e ainda tem que provar, a cada balcão, o que é, quem é, e porque o é. Cansa até. Como a poesia é feita do impacto entre a poeta ou o poeta e sua experiência de viver, está presente todo o tempo, nas escuridões de Terra Negra, a luta existencial de todas nós”, escreveu Elisa Lucinda sobre Terra Negra de Cristiane Sobral.
9. Mulheres Negras e Museus de Salvador: Diálogo em Branco e Preto
Fruto da dissertação de mestrado da museóloga Joana Flores, o livro traz a discussão sobre o lugar que é atribuído às mulheres negras nos museus de tipologia histórica de Salvador, a partir das exposições de longa duração quando as representam quase sempre na condição de escravizadas. Por se tratar de uma obra com o financiamento público do Governo do Estado da Bahia, 3 mil exemplares estão sendo distribuídos gratuitamente entre museus, universidades e bibliotecas públicas, bem como à pesquisadores que tenham interesse no tema.
10. Lundu
Um livro feito à mão – costurado artesanalmente, da poeta Tatiana Nascimento. Lundu foi publicado pela Padê editorial.
Segundo Tatiana, o livro foi montado por ela e Bárbara Esmenia em julho de 2015. “O foco da padê é a publicação de autoras negras, & além de poesia, que tem uma coleção específica (Odoyá, homenagem a Yemanjá), a padê vai publicar prosa (ficção, teoria), receitas (de alimento e/ou de cura), infanto-juvenis, traduções y fotografia, ilustrações, textos não-palavra. Lundu, tem 1ª tiragem de 300 exemplares, capa dourada com gravura feita uma a uma pelo gravurista Leonardo Freitas, & mais de 80 poemas maravilhosos”. (palavrapreta – Facebook)
Escrevivências – o conceito
O que é a escrevivência? Conceição Evaristo (Imagem destacada – foto de capa da postagem) esclarece: “Quando falei da escrevivência, em momento algum estava pensando em criar um conceito. Eu venho trabalhando com esse termo desde 1995 – na minha dissertação de mestrado, várias vezes fiz um jogo com o vocabulário e as ideias de escrever, viver, se ver. Usei ‘escrevivência’ pela primeira vez em uma mesa de escritoras negras no seminário Mulher e Literatura.”
Conceição Evaristo enfatiza: “Terminei meu texto dizendo: A nossa escrevivência não pode ser lida como ‘histórias para ninar os da casa grande’ e sim para incomodá-los em seus sonos injustos.”
Boa Leitura!
Com informações: Donminique Azevedo – Repórter do Portal Correio Nagô / Jornal Nexo