Evangélicos acampam em ponte: mobilização já salvou centenas de pessoas do suicídio

Um acampamento foi montado por um grupo de evangélicos na cabeceira da Ponte Newton Navarro, em Natal (RN).  No local, voluntários começaram a revezar 24 horas por dia para impedir que pessoas cometam suicídio.

A ponte liga as regiões Leste e Norte da capital potiguar e passa por cima do encontro do Rio Potengi com o mar. A parte mais alta da estrutura tem 60m de distância até a água.

Somente este ano centenas de pessoas foram até a ponte para tentar suicídio. Os “Sentinelas de Cristo”, como são chamados, estão com binóculos e coletes, espalhados em pontos estratégicos da ponte. Em 12 dias de vigília, os voluntários conseguiram impedir que 45 pessoas se jogassem da Newton Navarro.

Missão divina

O pastor Rubens Medeiros se disse convocado a lutar contra esse cenário quando, em uma noite, despertou de um pesadelo no qual seu filho de três anos era uma dessas vítimas. “Eu o via subir a ponte e saltar. Acordei apavorado. Naquele momento, entendi que Deus estava falando comigo. E decidi que iria acampar aqui para evitar que as pessoas façam esse horror”, disse.

Ele e seus voluntários já evitaram 84 suicídios. “Apenas uma pessoa conseguiu. Foi uma pena”, disse o pastor com o olhar vago, mirando a ponte. 

Ailton de Oliveira, de 51 anos, é um desses sentinelas. Ele declarou: “As pessoas param aqui para nos cumprimentar. Mas também param para encontrar um ponto descoberto para se jogar”, disse, ao explicar seus cuidados.

Assim como o pastor, Oliveira disse que está em missão divina, com um caráter de gratidão: “Há seis anos estou livre das drogas. Estou aqui hoje para retribuir o que Deus fez por mim. Eu também subi essa ponte para me matar. Mas, na hora de pular, Deus conversou comigo. Agora é minha vez de devolver esse gesto”. 

O sentinela Ailton Oliveira, na Ponte Newton Navarro Foto: Dinarte Assunção | Agência O Globo

Entre os voluntários, está um homem que, em 2012, pulou da ponte e sobreviveu. Hoje, Grégore atua no projeto como voluntário. Ele e os colegas dizem que só deixarão o acampamento depois que uma proteção for colocada na estrutura, para evitar que mais gente se jogue lá de cima.

“Fazemos todo um trabalho de acolhimento, mas é muito maior do que nós imaginamos. É preciso que essas ações sociais tomem, realmente, uma proporção maior”, afirma Valdir Luiz, um dos voluntários.

Na noite da Sexta-feira da Paixão de Cristo, uma mulher dirigiu pelas ruas de Natal (RN) com o propósito de tirar a própria vida. Prosseguiu dirigindo em direção à Zona Leste da cidade, cada vez mais próxima à Ponte Newton Navarro, monumento estaiado que chega a 55 metros de altura, o equivalente a um prédio de 18 andares, que fica sobre o encontro do Rio Potengi com o Oceano Atlântico. Ao chegar à cabeceira da ponte, estacionou o carro e começou a subi-la a pé, até que foi bruscamente interrompida. 

Em 12 dias de vigília, os voluntários conseguiram impedir que 45 pessoas se jogassem da Newton Navarro. Foto: Reprodução

“Foi a primeira noite em que montei acampamento e vi essa mulher surgir subindo a ponte. Corremos e a agarramos. Na primeira noite, éramos apenas eu e mais dois voluntários. Conseguimos impedir que ela se atirasse”, relembrou o pastor Rubens Medeiros, de 45 anos, da Assembleia de Deus. De lá para cá, ele fixou acampamento na cabeceira da ponte. A ação tem chamado a atenção.

O trabalho das sentinelas foi equipado graças à repercussão que o caso teve. Elas se dividem em equipes de plantão e cobrem toda a extensão da ponte, três equipes de cada lado. Como receberam mais de 20 rádios para comunicação, toda vez que um transeunte começa a subir a ponte, todas as pessoas são avisadas que pode se tratar de um suicida em potencial.

Nas 84 histórias que tiveram suas tentativas de suicídio interrompidas, há em comum a dor. “É impressionante o número de pessoas que tentam se matar porque não se sentem amadas”, descreveu Rubens. Nesta semana, uma das histórias em particular tocou a todos: uma mãe subiu a ponte com seu bebê nos braços para dar fim à própria vida e à do filho. “Ela não se sentia merecedora de amor”, revelou Oliveira. 

Apesar de a ação do grupo ter viralizado nas redes sociais, o pastor Rubens Medeiros ainda não conseguiu o apoio que quer para desmontar seu acampamento, que atualmente chega a ter 500 pessoas por dia. “Só vamos sair daqui quando mandarem patrulha para esta ponte enquanto providenciam a rede de proteção”, afirmou convicto. 

De militar a pastor 

O pastor Rubens Medeiros na Ponte Newton Navarro Foto: Dinarte Assunção | Agência O Globo

Rubens Medeiros, 45 anos, é pai de três filho. “Servi como militar aqui em Natal. Mas hoje sirvo a Deus”, disse.  

Além de congregar em sua igreja, ganha a vida como trader, operando na bolsa de valores. “Mas quem é fera mesmo nisso é um amigo meu a quem confio tudo, o Pedro. É ele que fez a maior parte das ações para mim”, confidenciou. Segundo disse, já gastou do próprio bolso quase R$ 5 mil. Das doações que chegam ao local, poucas são em forma de dinheiro. Foram quase R$ 2 mil até agora, explicou ele. 

Depois que a Cruz Vermelha doou duas barracas e eles conseguiram montar uma estrutura com cozinha, chegaram banheiros químicos doados por igrejas. Para tomar banho, eles se revezam em uma casa alugada por R$ 250 a alguns metros do acampamento, de onde puxaram uma fiação que fornece luz para o local. 

A mobilização de Medeiros fez outros profissionais se prontificarem para a ação. Há advogados, psicólogos e psiquiatras engajados na causa, entre outras especialidades. Caso da educadora física Leila Maia. Engajada em projeto de conscientização sobre depressão, ela se juntou ao pastor nos esforços para conseguir os equipamentos de segurança da ponte.

Mensagens de encorajamento

O pastor Rubens Medeiros e Leila Maia, próximos da Ponte Newton Navarro Foto: Dinarte Assunção | Agência O Globo

“Meu projeto nasceu de uma inspiração na Coreia do Sul, quando a Samsung fez uma campanha em uma ponte que também estava sendo utilizada para suicídios e conseguiu redução de 85% dos casos”, explicou. Graças à ação de Maia, 80 mensagens de encorajamento pela vida estão espalhadas ao longo dos quase três quilômetros da Ponte Newton Navarro. 

A relação de Rubens com Deus ao longo de todo seu acampamento, contudo, foi fortemente abalada quando seu telefone tocou numa tarde de sábado e, do outro lado, sua mãe anunciara que o pai havia acabado de morrer depois de um ataque fulminante. 

O acampamento na Ponte Newton Navarro, em Natal, Rio Grande do Norte Foto: Dinarte Assunção | Agência O Globo

“Eu perguntei o que Deus queria de mim. Pensei que, àquela altura, mais de 70 famílias deveriam estar enlutadas porque teriam algum familiar que se matou, mas não estavam graças a nosso trabalho. Então, por que a minha era que estava em luto? Por quê?”, queixou-se o pastor, que garante, no entanto, que não busca mais a resposta. “Já a encontrei fazendo o que faço aqui”, afirmou. 


Com informações: G1 / Época 

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