País vai treinar família para melhorar vida de criança autista
Finalmente a dívida do governo brasileiro com famílias de pessoas com autismo começa a ser paga. A partir deste mês vai ser implantado um programa internacional, chancelado pela Organização Mundial da Saúde.
De acordo com as informações, o objetivo é capacitar famílias com crianças do espectro do autismo, que envolve diversos graus de comprometimentos.
Um convênio com a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), apoiado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e que irá treinar até mil pessoas inicialmente foi assinado pelo Ministério da Saúde, quando se celebrou, dia 2 de abril, o Dia Internacional de Conscientização do Autismo.
Pais e cuidadores receberão dicas de ferramentas que otimizem a vida de crianças com autismo, de 2 a 9 anos, em dez estados brasileiros, em todas as regiões.
Até hoje, apenas a China teve programa de maior impacto. No entanto, o Brasil sai atrás de Argentina, Uruguai e Chile na adoção desse método.
O investimento é de R$ 2,5 milhões a serem aplicados durante dois anos na logística dos treinamentos.
Aspectos trabalhados
Os disseminadores do método, desenvolvido por uma instituição dos EUA, a Autism Speaks, e validado pela OMS, irão trabalhar aspectos de sociabilidade, comunicação, controle de agressividade e outros pontos de comportamento que desafiam os pais no trato com seus filhos.
De acordo com o Ministério da Saúde, esse é o maior programa de saúde pública já desenvolvido no país para esse grupo social.
“Não será necessário que a criança tenha diagnóstico fechado para que a família tenha direito ao treinamento. O objetivo é que os cuidadores consigam ter instrumentos dentro de casa para lidar com atrasos de comunicação, de sociabilidade etc”, diz a psicóloga Cristiane Silvestre de Paula, coordenadora nacional do programa.
A coordenadora destacou ainda, que pesquisa questões relativas ao autismo há 12 anos, a faixa etária de 2 a 9 anos foi escolhida por ser uma “janela de oportunidade” de aprendizado.
“O treinamento não propõe milagres nem vai substituir as terapias tradicionais. Mas dentro do quadro de cada indivíduo, espera-se uma evolução, uma melhora geral”, salientou Cristiane Silvestre.
“A estratégia, no momento, é para as crianças. Os jovens terão outros programas, no futuro.”
Até o final deste ano, o Ministério da Saúde realizará capacitação dos primeiros disseminadores da técnica e a adaptação e validação do material didático estrangeiro para a realidade brasileira.
Em um primeiro momento, dois especialistas irão treinar grupos pequenos de médicos, psicólogos, terapeutas ocupacionais entre outros que, por sua vez, repassarão o conhecimento para grupos maiores, que deverão contar com agentes de saúde do SUS e outros profissionais. O crescimento do número de pessoas habilitadas segue o formato de pirâmide.
Só a partir daí, o treinamento se voltará para as famílias, que terão nove oficinas em conjunto com outros pais e três sessões exclusivas, em casa, para poder individualizar as questões do filho.
“No período de treinamento nas casas, todos os membros da família vão poder participar. A intenção é que mais de uma pessoa do núcleo familiar seja habilitada para não haver sobrecarga para as mães, o que normalmente acontece”, diz Cristiane.
O Paraná é o estado piloto da iniciativa no país, a ONG Ico Project investiu sozinha R$ 300 mil para o início da implantação do programa internacional.
Em três anos, agora com o apoio federal, espera-se que todos os pais de crianças com autismo desse estado estejam capacitados.
Ainda não há prazo para o treinamento de todas as famílias de crianças com autismo no Brasil, o que vai depender de contrapartidas municipais e da realidade de cada localidade.
Estima-se que 2 milhões de pessoas sejam do espectro no Brasil e elas são amparadas pelos mesmos direitos das demais pessoas com deficiência no país.
“Vamos formar mil multiplicadores no primeiro momento. Todo o processo é frequentemente avaliado e validado pela OMS. Temos uma dívida histórica com o autismo no Brasil e estamos começando a enfrentar a questão”, declara Quirino Cordeiro, coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde.
Fundamental
Para a artesã Josiele Freitas, 34, mãe de João Victor, 11, que recebeu diagnóstico de autismo leve aos três anos e meio, a orientação básica para que os pais saibam lidar com os filhos no dia a dia é fundamental para dar qualidade de vida à família.
“Nós recebemos orientações de uma instituição, mas, mesmo assim, às vezes, ainda ficamos perdidos em algumas situações e pedidos socorro em grupos de redes sociais para pais com mais experiência”, declara.
Segundo Josiele, “A maioria dos pais hoje fica perdida, sem saber como lidar com o próprio filho em situações básicas dentro de casa. E, pior, não sabem o que fazer fora de casa também, quando a criança entra em crise, as pessoas começam a olhar e gera-se um clima horrível. Se houvesse um direcionamento, de como agir, com simulações, com certeza tudo seria muito melhor e as crianças estariam melhores”.
Treinamentos
Os treinamentos serão gratuitos, e não apenas famílias de crianças com autismo poderão fazê-los, mas também àquelas com filhos com atraso no neurodesenvolvimento.
A técnica implica uso de figuras com modelos e ideias de como agir diante das mais diversas situações com a criança. O treinamento envolve também aplicação de planos terapêuticos, revisão, avaliação e troca de experiências entre os membros do grupo.
Com informações: Folha de S.Paulo / Correio do Estado